23 outubro 2012

2 - Phillip


No dia seguinte, lá estava Carolina no banco da praça e dessa vez tinha um pequeno caderno de anotações com um poema que escrevera no dia anterior e que lia atentamente:

“Ontem à noite, sonhei com você.
Seu retrato na estante
Num doce rompante
Sua voz ao telefone
Dizendo de longe o que quero ouvir.
A essa hora não sei lhe dizer...
Tudo o que penso, some no ar.
E tudo o que sei é que irei sempre te amar.
Eu não quero parar de pensar,
No quanto amor eu já lhe dei
Eu não quero parar de pensar,
No quanto eu lhe quero bem.
Você aqui deitado, a cama nos abraça
A paixão nos guia...
Eu amo você.”

Quando terminou a leitura, olhou disfarçadamente para os lados, mas Phillip não estava lá. Pensou mil coisas, pensou que ele talvez não tenha gostado muito dela.
Esperou por mais alguns minutos, até visualizar ao longe uma pessoa com passos largos, parecendo estar atrasado para um encontro.
Ela tentou disfarçar, voltando para a leitura, mas não resistiu e olhou novamente e dessa vez, Phillip estava a segundos dela.
- Oi! Achei que você não estaria mais aqui. - falou Phillip ajeitando os cabelos despenteados pelo vento.
- Que nada! Cheguei agora! - mentiu Carolina e pensou:
“Até ajeitando os cabelos, ele fica charmoso. Li em um livro que esse gesto é de interesse, conquista, bem...”
- Estava com um cliente super exigente, daqueles que querem acompanhar cada processo do trabalho nos seus mínimos detalhes.
- Seu trabalho é bem agitado, não? - questionou Carolina abrindo um pouco a boca.
- Demais! - falou Phillip tentando ainda recuperar o fôlego.
- O meu já é pacato demais, burocrático e rotineiro. Nada de emocionante acontece por lá. Chego no horário, almoço no horário, saio às 17h em ponto. Pareço um robô!
- Você parece não estar satisfeita com ele, Carol...
- Às vezes me sinto insatisfeita, em outros, adoro o meu trabalho. Talvez se eu não tivesse os colegas que tenho, seria enfadonho. Na verdade queria ser escritora, poder viajar, conhecer as culturas dos países, as pessoas e escrever sobre elas. - falou Carolina num tom triste.
- E você já tentou fazer isso, Carol? Escrever?
- Sim! Tento o tempo todo, mas não consigo sair de uma página. Acho que me falta experiência, inspiração. Sei lá...
- Carol, acho que falta é disposição para você conhecer pessoas e seus lugares.
- É... - sussurrou Carolina.
Phillip deu uma olhada minuciosa em Carolina eno caderno que carregava, aproveitando que ela estava com a cabeça baixa e notou uma aliança um pouco escondida debaixo de um anel. “Seria ela noiva?”, pensou.
- Desculpe perguntar, mas reparei que você usa uma aliança. Você está noiva?
Carolina ficou encabulada com a observação.
- Não, não sou. Era a aliança de minha mãe. Uso para homenageá-la, de qualquer forma. Como se ela estivesse sempre comigo.
- Hmmm, entendo. Deve ter sido muito dolorido sua perda, mas ao mesmo tempo fico feliz. - falou Phillip, deixando sair um sorriso encabulado.

18 outubro 2012

3 - Sonho


Quando foi a última vez que você fez algo de diferente? - Phillip levantou os óculos escuros quando fez a pergunta para Carolina.
Carolina ficou surpresa, pois não conseguia lembrar-se de nada de diferente.
- Não sei, acho que foi quando tentei pintar meu cabelo de loiro e como não deu certo, tentei disfarçar usando chapéus e lenços. Pintei o cabelo várias vezes para voltar à cor original e nada ficou do meu jeito. Meu cabelo ficou uma palha de aço. - riu Carolina.
Phillip riu junto e falou que aquilo não era nada de desafiador do que realmente estava pensando, era diferente.
- Você tem razão, mais isso me fez crer que não fico bem sendo loira. Foi uma experiência traumatizante!
- Bem, a última coisa que eu fiz foi um mergulho em alto mar em Fernando de Noronha no Natal passado. Meus amigos e eu planejamos esta viagem durante seis meses, juntamos grana, tiramos uma semana de licença no trabalho e fomos. Foi incrível! Aposto que você iria curtir muito, Carol.
- Talvez curtir a viagem, mas mergulhar? Não sei nadar direito, Phillip!
- Não? Ahhh, mas isso você terá que aprender.
Naquela noite, Carolina não conseguia dormir. Pensava no quanto queria mudar, mas ao mesmo tempo se sentia presa, não tinha forças.
Sonhou com Phillip como um peixe querendo devorá-la. Amedrontada, Carolina nadava sem parar em busca da superfície e quando olhava para trás, o peixe se distanciava e foi então que viu uma rede de malha larga de pescador tentando salvá-la, quando acordou.
Será que Phillip veio justamente para me tirar desse ciclo?
Ter vontade e ambição de mudar?
Não seria nada mau um empurrãozinho dele...
Junto com ele, teria uma vontade maior de mudar, um ótimo incentivo.
Sorriu balançando a cabeça e voltou a dormir.

16 outubro 2012

4 - Surpresa



Desta vez, Phillip chegou antes de Carolina na praça. Estava ansioso para falar com ela.
Assim que a viu, a puxou pelo braço e falou:
- Vamos, Carol, vou levar você a um lugar e tem que ser rápido. Você hoje não vai ficar sentada neste banco sujo! - falou bruscamente, Phillip.
Sem saber o que dizer, Carolina acatou suas ordens e seguiu com ele.
"Espero que não seja um sequestro relâmpago", pensou ela.
Não demoraram muito e chegaram ao local.
Era um prédio com a fachada toda em madeira, com uma decoração rústica na entrada e por dentro grande e espaçosa, com itens modernos e relaxantes.
Logo que Carolina entrou, se deparou com a recepcionista, muito simpática, trajando roupa branca, dos pés a cabeça. 
Ela encaminhou os dois a uma sala arejada, limpa e florida.
- Phillip! Não acredito que estou aqui, que lugar lindo e no meio da cidade, como você achou?
- Carol, tenho meus contatos e não foi tão difícil como parece. Você gostou?
- Se eu gostei? Estou amando, mesmo antes de receber a massagem!
Ficaram sentados em uma poltrona amarela, um do lado do outro, colocaram um pequeno ofurô com pétalas de rosas coloridas que Carolina mergulhou os pés. A água estava morna e deliciosa! Ficou um tempo descansando ali.
Logo depois, a massagista lavou o pé de Carolina cuidadosamente, massageando e depois os secou com uma toalha branca. Espalhou um óleo bem devagar nos pés e começou a sessão. Carolina olhou para Phillip que sorria de orelha a orelha contagiando Carolina também.
A massagista pressionou a sola, alongou os dedos, usou o polegar, massageou o peito do pé e entre os tendões. Toda vez que mudava a posição, a massagista explicava o ponto da massagem. Sensação divina!
Carolina não dormiu, pois queria curtir cada momento, mas a vontade era de tirar um cochilo rápido, mas não o fez.
Olhou novamente para Phillip e ele estava com os olhos fechados. 
"O que será que ele está pensando agora?", pensou Carolina.
Logo que terminou a massagem de um pé, a massagista deu atenção ao outro, mas antes, o envolveu em uma toalha macia e aquecida, deixando descansar.
Quando a sessão acabou, ofereceram um lanche para eles; chá de erva-cidreira com sanduíche natural de peito de peru.
- Nada como sair da rotina, não é Carol?
- Phillip, obrigada por me trazer a este lugar, foi a minha primeira vez, nunca tinham feito uma massagem tão deliciosa como esta. Estou me sentindo até mais leve!
- Ontem fiquei pensando no que disse, sobre o seu emprego, sua vida e fiz uma lista de programas que iremos fazer no decorrer dos dias. Você topa?
- Que programas, Phillip? - Carolina abriu os olhos espantada.
- Surpresa, não vou contar nada, nem que me torture. Quero ver nos seus olhos sua reação, se gostou ou não. Quero ajudar e isso será um divertimento para mim também. Você topa? - insistiu Phillip.
- Bem... Acho que estou em boas mãos, você não é nenhum tipo de psicopata não é mesmo? Não vai me raptar ou abusar de mim? - riu Carolina.
- Vou fazer pequenos raptos, mas nada que fira sua honra, senhorita! Tenha certeza.
- Então, eu aceito! - Carolina ofereceu sua mão para um acordo.
- Combinado! - Phillip segurou por mais alguns segundos a mão de Carolina.
- Amanhã tem mais. - falou Phillip com um olhar misterioso para Carolina, que apenas sorriu.

15 outubro 2012

5 - Natureba


Depois daquela incrível massagem, Phillip mandou um torpedo para Carolina à noite, com os seguintes dizeres: "Carol, amanhã, não almoce, não leve comida, você vai almoçar comigo! bj. Phill".
Carolina tremeu na base. Almoçar com Phillip. Olho no olho, será que ela saberia se portar à mesa? Phillip parece tão educado, tão sabido nessas coisas. Carolina pensou em colocar sua melhor roupa amanhã.
Ao meio-dia em ponto, Phillip estava na frente do prédio à espera de Carolina. Seus colegas o viram, mas Carolina não dissera nada a eles sobre o encontro e muito menos sobre Phillip. Eles devem estar curiosos.
Phillip vestia uma calça preta com uma camisa bege, de botões e uma bota de cano baixo. Enquanto Carolina usava uma saia florida, uma blusa com transparências na cor salmão e uma sapatilha dourada.
Phillip deu um beijo único no rosto de Carolina e foi andando na direção de seu carro.
- O lugar é um pouco distante, mas dá tempo. - falou Phillip eufórico.
O carro, uma Land Rover prata linda e o engraçado é que era o carro predileto de Carolina. Gostava desse tipo de carro.
Entraram em um restaurante vegetariano a vinte minutos dali.
O lugar era bonito e estiloso, em cada mesa uma sombrinha acolhedora, luz quente e vários bambus cercando o local. O ambiente era muito agradável.
Como nunca tinha ido a nenhum, Phillip se fez de cicerone e indicou um prato, era ele: Salada de grão-de-bico com hamburger de aveia, salada e alguns pães.
Enquanto esperavam a refeição, eles se deliciaram com suco de abacaxi e hortelã, bastante apetitoso.
- Agora a sua meta é uma refeição saudável, nada de carnes gordurosas, é bom comer algo leve e deixar o excesso para um dia apenas.
- Sim, senhor. Contratei um personal faz tudo e nem faço ideia de quanto é o valor. - riu Carolina, segurando o canudinho do suco.
- O valor você verá depois, sua satisfação é o meu compromisso. - riu Phillip.
O garçom chegou com os pratos e falou com cortesia: Bom almoço e bom namoro!
Phillip e Carolina ficaram sem graça, mas mesmo assim agradeceram ao garçom cortês. E iniciaram a refeição.
Carolina achou tudo delicioso, mas pensou que talvez sentisse fome à tarde e compraria um lanche. Phillip concordou e falou: 
- Nada de doce!
- Nem uma pizzazinha? - protestou Carolina.
- Nem pensar nisso! - riu Phillip.
O celular de Phillip toca e ele fica na dúvida se atende ou não. Carolina vendo seu impasse fala: - É melhor atender!
Phillip atendeu com um alô seco e ficou a maior parte do tempo mudo, quando se despediu dizendo que iria ligar mais tarde.
Phillip voltou para a sua refeição, sem nada falar.
"Quem será que ligou para Phillip? Não vou perguntar e nem tenho direito a isso", pensou Carolina.
Voltaram para o centro, voltando para os seus trabalhos.
- O almoço foi delicioso! Estou até mais animada para o trabalho.
- Realmente, foi um ótimo almoço, Carol. Nos falamos mais tarde?
"Era uma pergunta, isso? É lógico que sim, eu não sairia do seu lado por nada", pensou Carolina.
- Sim, claro, a qualquer hora!
Despediram-se com dois beijos e Carolina ficou parada vendo o carro sumir aos poucos.


11 outubro 2012

6 - Chuva


Carolina acordava todos os dias dez minutos antes do horário do despertador. Ele já não era mais necessário, mas mesmo assim, tinha medo de perder a hora e antes que ele tocasse, Carolina ficava pensando em tudo o que acontecera nos dias anteriores, como se pudesse alterar algo que tenha feito que não a agradou. Às vezes isso a martirizada. Tentava dissipar os pensamentos pensando no pão quentinho com manteiga e queijo que devoraria em alguns minutos ou na roupa que usaria para o trabalho.
Levantou-se e avistou Agatha, a gatinha que era do irmãoequedormia no quarto de Carolina, enrolada, parecendo um tufo de pêlos em cima da almofada preferida de Carolina e pelo visto era a dela também. 
Agatha nem piscou. O nome era em homenagem a escritora britânica, Agatha Christie, mundialmente conhecida por suas histórias de mistério e suspense e que Carolina adorava.
Foi até ao quarto do irmão, Miguel, dar uma olhada nele. Estava descoberto e rapidamente o cobriu. Miguel só estudava à tarde, então ele tinha muito tempo ainda para o seu sono. Aos 10 anos, Miguel era um menino tímido, porém muito esperto. Tinha grandes olhos curiosos, cabelos encaracolados e duas covinhas charmosas no rosto. Seu pai, Júlio, também dormia, em outro quarto.
Carolina fez tudo silenciosamente. Tomou banho, preparou um café forte e comeu um bolo de laranja feito no dia anterior, por ela. Esse era o café da manhã de hoje. Pegou seu numerox e jogou um pouco para dar o horário do trabalho e reparou que estava chovendo. E muito!
Então, sem pensar muito, pegou sua bolsa, o guarda-chuva e foi para o trabalho, mas antes deixou um recado na geladeira para o seu pai.
Na hora do almoço, foi até a praça se encontrar com Phillip, mas ele não estava lá.
"Talvez a chuva tenha atrapalhado seus planos”, pensou Carol.
“Mas pode ser que ele venha, vou esperar mais um pouco", se convenceu ela.


10 outubro 2012

7 - Pela Janela



Pela janela, Phillip olhava o trânsito caótico por causa da chuva. Estava com um semblante irritado ao telefone. Do outro lado da linha, Luciana, sua ex-mulher por quase três anos. Moraram juntos, mas não se casaram e não foi por falta de incentivo de Luciana; Phillip não queria e estava certo. 
O relacionamento era muito conturbado e não estava certo se ela seria sua cara metade. Não tiveram filhos, mas Luciana estava sempre tentando, achava que Phillip deveria sustentá-la, pois não queria mais trabalhar, não queria ser subordinada por chefes impacientes e a cada atitude de Luciana, Phillip se sentia mais no buraco fundo, sem se permitir sair dali. Até que resolveu dar um basta e foi aí que tudo começou a desmoronar.
Luciana agora estava brigando pelo apartamento onde Phillip vivia. Na briga, Luciana fez as malas e foi correndo para a casa da mãe, enquanto Phillip permaneceu. Agora ela quer que ele venda o apartamento e briga pela parte dela. 
Durante o tempo em que Luciana ficou calada, ele dera dinheiro a ela, como se fosse um aluguel, da própria casa, para que ela o deixasse um tempo em paz. Mas, depois de seis meses, a paz acabou. E, Phillip estava perdido, sem saber o que fazer, pois não queria sair daquele apartamento, que afinal de contas, era praticamente dele, pois ela ajudou pouco. 
E entrar num processo seria ainda mais estressante.
Pensou em Carolina e percebeu que tinha perdido o encontro com ela. 
E chovia, chovia muito.
Deveria explicar o que estava acontecendo e irá fazer isso logo.

08 outubro 2012

8 - Fofoca


Carolina resolveu tomar uma atitude. Já que Phillip não entrou em contato, resolveu ir até seu trabalho, no final do expediente, para uma surpresa.
Não sabia exatamente onde era, mas sabia o nome da empresa, chamava-se Parnaso, Agência de Publicidade. Phillip tinha dito a Carolina o significado do nome e era relacionado à poesia; coleção de poesias e também um Monte da antiga Grécia consagrado a Apolo e as musas. Carolina achou bem interessante quando ele contou e assim que chegou ao trabalho, anotou em seu caderninho de anotações.
Bem, já era um começo. Saiu logo que bateu o fim do expediente.
Procurou algumas casas comerciais e nada. Entrou num enorme prédio comercial e avistou os letreiros com os números das salas. Procurou por Parnaso e achou. Ficava no 5º andar.
Foi até o porteiro e perguntou se ele conhecia Phillip. O porteiro, muito educado, deu um sorriso e afirmando com a cabeça falou a Carolina que ela podia subir, pois ele ainda estava no prédio.
Carolina foi para a porta do elevador, apertou o botão ajeitando os cabelos e esperou. 
Deu de cara com Phillip saindo, mas ele não estava só.
Com ele, uma loira, de longos cabelos lisos, bem maquiada e com várias pulseiras douradas no braço. Ela estava sufocando-o com palavras agressivas, enquanto Phillip fazia o mesmo.
Quando Phillip percebeu a presença de Carolina, arregalou os olhos surpresos e sentiu seu estômago revirar.
Luciana ainda não tinha parado de falar esósedetevequando Phillip a repreendeu com dois toques em seu braço 'decorado'. 
- Carol! Que surpresa! Desculpe por não...
Luciana cortou a frase de Phillip para um deboche:
- Hmmm, então ela é sua nova conquista, ãh? Cuidado, queridinha, ele é casado! - falou Luciana, saindo de cena segurando sua bolsa por cima dos ombros e jogando beijinhos sarcásticos para os dois.
- Carol, desculpa por ter visto essa cena. Vou te contar tudo mais tarde, pode ser? Podemos nos encontrar à noite, pego você em casa. - falou um Phillip nervoso.
Carolina estava um pouco aturdida, mas a palavra 'casado' não saía de sua cabeça.
"Não acredito que ele é casado e com aquela mulher, meu Deus, como pude ser tão imbecil!", pensou Carolina.
Depois de pensar um pouco, Carolina aceitou o convite. 
"Ele precisa se explicar, afinal... Afinal, ele precisa!", pensou irritada.
- Mais uma vez, desculpe. Dou uma carona para você. - falou Phillip sem graça.
- Tudo bem, não precisa, passei por aqui hoje, mas na verdade é caminho para outro lugar, tenho um compromisso naquele prédio... - falou Carolina apontando a esmo.
- Ok, tudo certo então? Às 20.30h?
- Tudo bem. - falou Carolina, tentando abrir um sorriso.
Despediram-se com um beijo e Phillip apertou a mão de Carolina com firmeza, como um pedido de desculpas, mais um.
Carolina saiu tão atordoada que parecia que estava sozinha na calçada, sem rumo, não via ninguém, só queria deitar em sua cama e esquecer este incidente. Achava que tudo aquilo que passaram fora um passatempo para Phillip e que estava estampado em sua testa a palavra: Decepção.

04 outubro 2012

9 - Acertos


Sexta-feira à noite. Carolina estava esperando Phillip de dentro da portaria, quando viu sua Land Rover prata chegar.
Esperou para ver se Phillip saía do carro. Ele demorou alguns segundos e saiu, indo em direção ao interfone do prédio. Carolina saiu da portaria logo em seguida.
- Oi! Chegamos à mesma hora. - Carolina falou, não querendo mostrar sua ansiedade.
- Acabei de estacionar... Tudo bem, Carol? Vamos? - falou Phillip impaciente.
Seguiram juntos para o carro e Phillip fez uma observação:
- Você está linda, Carol!
Carolina vestia uma camisa branca listrada, com uma saia vermelha, num laço da mesma cor fazendo-se de cinto e uma sandália alta. 
Enquanto Phillip estava bem casual; de jeans e blusa xadrez.
- Obrigada, Phillip. Você também está muito bonito. - Carolina sorriu e virou seu rosto para a janela do carro.
Chegaram em um lugar muito bonito, um restaurante praticamente na areia da praia e perto do restaurante se avistava um forte, bem iluminado, com o mar batendo violentamente contra as rochas. 
- Dava uma boa pintura esse lugar. - falou Carolina encantada.
- Eu sabia que ia gostar! - falou Phillip dando uma piscadela.
Sentaram-se à mesa bem defronte ao mar, pediram uma refeição leve que chegou logo e então, começaram.
- Carol, aquele dia foi muito esquisito. Você deveria saber que, se estou aqui com você, é porque não tenho nenhum compromisso com ninguém.
- Não foi isso que foi passado para mim. - falou Carolina rude.
- Eu sei, posso imaginar. A Luciana foi minha namorada e ela é daquele jeito mesmo...
- Namorada? Entendi que fossem casados.
- Não... E sim. Na verdade moramos juntos durantes três anos. Mas nunca casamos. Pela cabeça da Luciana, somos casados no papel, tudo o que é meu, é dela e se duvidar, ela deve achar que temos até filhos!
- E tem? - Carolina levantou a sobrancelha.
- Não, Carol, não temos e não vamos ter. Nós já nos separamos há mais de um ano.
- Então, o que ela estava fazendo no seu trabalho? Sei que não me deve explicações... - falou Carolina fazendo bico e olhando para baixo.
- Devo sim, Carol. Você deve achar que estou brincando contigo, mas não estou. Desde que nos conhecemos, tenho tido bons momentos, até meus amigos brincam comigo por isso. Eles sabem da sua existência, na verdade. - Phillip falou, corando as bochechas.
- Então, Phillip, o que aconteceu?
- Você pode me chamar de Phill? É mais curto e menos formal - riu Phillip, quebrando a seriedade da conversa.
- Phill... Phill. Ok! - Carolina estava um pouco impaciente.
- É o seguinte. Quando moramos juntos, eu comprei o apartamento onde moro. Ela colaborou com uma parte, digamos assim: 20% do investimento. Eu entrei com a outra parte, com os móveis e pagava o condomínio. Enquanto ela pagava as despesas com supermercado, eu pagava as contas, mas depois de um tempo, ela começou a reclamar e achar que não deveria mais trabalhar, que estava cansada, que queria ter um filho e isso tudo aconteceu praticamente num momento ruim da minha vida. Meu pai ficou doente, e eu só pensava nele, minha mãe contava sempre com minha ajuda. Precisava conciliar o trabalho com as visitas ao meu pai e não podia pensar em ter filhos. Estava sobrecarregado e minha relação com ela minou. Não somente por isso, preciso admitir, mas pelas imposições traçadas por Luciana. Aquilo me desestimulou.
- Quais imposições, Phill?
- Ela queria ficar em casa, sendo sustentada por mim, não me ajudava em praticamente nada, só queria saber de shopping com as amigas... Eu não tinha uma companheira e naquele momento eu precisava de uma.
- Vocês tinham empregada?
- Sim, ela fazia questão! Empregada três vezes na semana. Era mais uma despesa para mim. Não que eu queria que ela fizesse tudo, não sou desses homens machistas que você deve estar pensado.
- Não pensei nada, Phill. Sei que tem mulheres que abominam afazeres domésticos, mas o mínimo que ela deveria fazer, se ela quisesse sair do emprego é pelo menos ajudar você em casa.
- Sim, mas isso era o menor dos problemas. Quando começamos o namoro, ela era uma mulher independente, carismática e doce. Depois de um tempo, virou outra mulher; mesquinha e egocêntrica.
- Deve ter sido duro pra você, ficar com uma mulher que não tinha mais nada a ver.
- Aguentei por um tempo, até ela chegar em casa e falar que tinha pedido demissão e que não procuraria emprego tão cedo. Perdi o chão. Eu não podia sustentar aquela casa sozinho, não mesmo. Tivemos uma briga feia e ela foi para a casa da mãe.
- E agora, depois de um ano, o que ela quer?
- Ela quer que eu venda o apartamento e dê a parte dela. Ela quer minha casa, Carol! - disse Phillip desesperado.
- Como é? Como é atrevida essa Luciana!
- Por favor, Carol, não cite mais o nome desta mulher! Eu cheguei a dar uma 'mesada' a ela todo mês, como um cala boca. Acho que alguém fez a cabeça dela para me pedir isso.
- Mas, você tem provas de que você deu dinheiro a mais no apartamento? De que pagava as contas do condomínio e outras despesas?
- Tenho, tenho tudo guardado, acredito que isso seja suficiente para que ela não pleite nada. Nem temos filhos, ela não tem direito a pensão.
- Acredito que não, Phill, mas acho que isso vai dar a você uma dor de cabeça danada!
- E eu não sei disso?
Tentando amenizar o problema, Phillip falou:
- Quer dizer que você achou que eu era um sultão... - riu Phillip
- Ahhh, quer dizer que você pensa nisso, né? - riu de volta, Carolina.
- Quem sabe se eu descobrir petróleo em algum canto... Você seria a minha concubina favorita, ok?
- Se tiver muito ouro, maquiagem e tecidos de fino trato, eu aceito! 
- Ah, essas mulheres...
- Ei, calma, não sou igual a sua ex-mulher, ãhn! - falou Carolina fazendo cara de quem estava chateada e depois caiu na risada.
- Assim você me mata, Carol! Ufa!
E terminaram o jantar.
- Depois daqui, quero mostrar o forte, pelo menos até as rochas, porque a essa hora já está fechado. Vamos? - falou Phillip, mais seguro de si.
- Vamos sim, achei a vista daqui lindíssima!
Chegaram andando calmamente, pisando nas pedrinhas das areias, alguns cascos e conchas, conversaram nesse meio tempo sobre os planos futuros e outras trivialidades.
- Olha! - apontou Carolina. Tem um farol logo ali! Adoro faróis, acho tão bucólicos e românticos! - falou Carolina parecendo uma criança que avista um ursinho de pelúcia gigante.
- Aqui é realmente muito bonito, de dia é muito agitado, o pôr do sol então, nem se fala!
Caminharam para mais perto das rochas e enquanto Carolina estava obcecada olhando para o Farol e para o mar, Phillip delicadamente aproximou-se mais de Carolina, abraçando-a por trás, num abraço confuso, porém muito revelador. 
Phillip tinha se entregado finalmente aos encantos de Carolina.

02 outubro 2012

10 - Sábado Divertido


Depois daquele repentino abraço caloroso de Phillip. Carolina ficou muito animada, mesmo não havendo beijo, ela já estava satisfeita por Phillip ter se explicado e comentado que os dias depois que a conheceu foram satisfatórios e agradáveis. 
Enquanto arrumava a bagunça do armário e preparava o almoço, Carolina pensava no quanto Phillip era um homem de caráter e esperava mesmo que isso fosse verdade, pois cansara de se decepcionar com os homens.
Quando o relógio bateu 11 horas, o celular tocou. Era Phillip perguntando se ela toparia sair com ele mais tarde e que ela precisava não sentir vergonha.
Carol ficou curiosa e perguntou o que era. Phillip só dizia: - É surpresa!
"Tinha que admitir, Phill era muito criativo e eu confiava plenamente nele.", pensou Carolina.
Voltou aos seus afazeres, colocando a mesa para o almoço, colocando a ração da gata e indo acordar Miguel, que tinha dado um cochilo rápido.
Na mesa, ela, Miguel e o pai conversavam.
- Você está namorando, Carol? - Miguel perguntou.
- Namorando? De onde você tirou isso, garoto! - falou Carolina.
- De lugar nenhum, ora. Mas vejo você pelos cantos falando no celular, nem dá pra ouvir!
- Se ela estivesse namorando, ela iria nos contar, não é mesmo, Carol? - indagou o pai.
- Sei não, hein? Carol está misteriosa demais por esses dias.
- Fica quieto, pirralho, come! - Carolina riu.
- Pai, mais tarde vou sair com a Sara, está bem? Vamos ao shopping.
- Olha aí, pai, mentira dela, vai sair com o namorado! Namorado! Namorado! - Miguel ria na cara de Carolina.
Carolina deu uns petelecos de brincadeira na cabeça de Miguel, o fazendo parar e comer.
- Bem, está dado o recado, vou sair e não sei a que horas volto, ok?
- Tudo bem, minha filha. Qualquer coisa me ligue! - falou o pai, enfiado na comida.
Carolina colocou seu jeans e uma blusinha branca e para dar um ‘up’ no visual, investiu num cachecol azul e prendeu seu cabelo num bonito rabo de cavalo. 
Phillip ligou para dizer que já estava chegando. E mais ou menos às 18 horas, Phillip apareceu e junto com ele, seu charme. Usava uma blusa de mangas longas com uma grande bola 8 de bilhar no meio da camisa, jeans e um coturno marrom. Saiu do carro e em vez de dar os famosos beijinhos na bochecha de Carolina, deu um abraço e um beijo em sua mão. Estava agitado desta vez e com um semblante feliz.
Chegaram ao centro da cidade, em uma área com inúmeros bares, e muita gente bonita, elegante e sincera.
Era um restaurante de dois andares. Haviam mesas e cadeiras na calçada, mas poucas pessoas nelas e pelo o que Phillip falou, ainda era cedo. Deixaram o carro com o manobrista e entraram no recinto.
O lugar era muito bonitinho, tinha uma decoração um pouco antiga, com escadas de ferro em formato de caracol, mesas e cadeiras no estilo velho oeste, pisos e paredes de madeira e o local estava cheio. Na parte de baixo, era restaurante e bar e foi ali que os dois ficaram quando chegaram. Escolheram uma mesa de canto, com dois lugares e pediram bebidas. Dessa vez, Carolina pediu um suco de goiaba e Phillip, um chopp.
- Adorei o lugar, Phill, bem diferente de tudo o que vi. Um achado bacana. -falou Carolina, ajeitando-se na cadeira.
- Você ainda não viu nada... - Phillip deu um sorrisinho de lado.
- O quê? Como assim? Não vai me dizer que Clint Eastwood* vai aparecer com arma em punho aqui!
- Sabe que é a cara dele este lugar? - riu Phillip.
- Ou então terá algum duelo mortal e teremos que fotografar junto com o infeliz depois de terminar... - Carolina com suas ideias de jerico.
- Nada disso... Calma, você está muito curiosa! Olha só chegou seu suco, ainda bem! - falou Phillip dando um gole em seu chopp.
Pediram um gurjão de frango para acompanhar a conversa.
- Como você está, Phill? Teve alguma notícia de sua ex?
- Tive sim, ela tem me ligado para me lembrar que existe e que quer a parte dela do apartamento. Já estou quase pedindo uma ordem de restrição contra ela. - brincou Phillip.
- Ai, credo, está assim, é?
- Ah, não vamos falar dela, não é? Ou você quer estragar nosso encontro?
- Hmmm, lógico que não, desculpe. - Carolina mostrou a língua.
Quando o restaurante começou a encher, Phillip resolveu levar Carolina até o 2º andar e ficou admirada com o que viu.
O piso de cima também tinha a mesma decoração do salão abaixo e era composto por duas salas enormes e no meio um corredor comprido que levaria aos banheiros. Um salão tinha música ao vivo e o outro; karaokê!
"KaraokêÉ uma cilada, Bino!”, pensou Carolina, imitando o bordão de um personagem da TV.
A palavra karaokê, de origem japonesa, é uma combinação de duas palavras abreviadas: Kara, que vem de karappo e significa "vazio" e Oke, que vem de okesutura e significa "orquestra".
- Ai, meu Deus, Phill, não acredito que você me trouxe para um karaokê!
- Sim, o que? Você é tímida? É para isso que viemos. - gargalhou Phillip. 
- Não vou cantar, eu canto muito mal, mal sei as letras das músicas, por favor, não me faça pagar este king kong! Tô com medo!
- Você precisa deixar essa palavra 'medo' de lado, Carol! Ninguém vai ficar julgando, é tudo uma brincadeira.
- Ok, já que estamos no inferno, abraçamos o devil lá, né mesmo?
- Isso aí, Carol, assim é que se fala! - E entraram na sala.
A sala estava cheia, com muitas pessoas nos bancos; bebendo, se divertindo e principalmente; rindo daqueles que cantavam. 
Tinha um homem de uns 50 anos, colocando toda a sua voz numa música do Wando, alguns aplaudiam, incentivando o homem e outros riam, porque realmente estava muito engraçado. 
Sentaram em um dos pufes que ficavam por todos os cantos. A sala de um lado tinha um enorme espelho, fazendo com que dobrasse o número de pessoas e do outro, janelas para que as pessoas pudessem ver o outro lado da sala, que tinha música ao vivo e pelo o que dava para ouvir, uma dupla tocava sertanejo, uma loira bonita e um rapaz de cabelos bem negros. A decoração da sala era toda em vermelho. Os pufes, os sofás por trás das mesinhas, o pequeno palco para que pudessem cantar e um microfone no meio, em um pedestal. 
Phillip veio correndo na direção de Carolina, dizendo que já tinha colocado os nomes deles na lista.
- Lista? O povo curte mesmo isso, hein? Estamos em qual posição? - perguntou Carolina.
- Estamos na 10ª! Mas vai passar rapidinho, é tão divertido que o tempo voa!

"Era esse o meu medo... Ops. Medo. Preciso riscar isso da minha mente", pensou mais uma vez Carolina. 
Passaram vários candidatos a Luan Santana, Marisa Monte, Falcão, Vanessa da Mata, Roberto Carlos, Rita Lee, Alcione, Jota Quest e Preta Gil. 
Até Whitney Houston passou, mas até que ele cantou bem. Sim, ELE!
Quando foi a vez do casal, Phillip pegou a mão de Carolina e caminharam-separa o palco, o povo batia palmas antes mesmo de eles começarem a cantar.
Carolina pigarreou ao microfone e Phillipmostrou as três músicas que escolheu na hora de pôr os nomes na lista: Kid Abelha, Rita Lee e Los Hermanos.
- Los Hermanos, por favor! - gritou Carolina.
- Ok, senhorita, então vamos lá. Cantaremos juntos!
E foram, em uníssono cantando a banda preferida de Carolina.

"Moça... olha só, o que eu te escrevi
É preciso força pra sonhar e perceber
Que a estrada vai além do que se vê..."
Carolina e Phillip se olhavam e cantavam.

"Sei, que a tua solidão me dói
E que é difícil ser feliz
Mais do que somos todos nós..."

Alguns cantavam junto, outros nem sabiam o que Carolina e Phillip cantavam. E era essa a diversão e mesmo assim, os que não conheciam, batiam palmas no ritmo da canção.
Phillip parecia ser cantor profissional, ele cantava muito bem, tinha uma voz potente ao microfone, enquanto Carolina, só desafinava.

"É bom te ver sorrir...
Deixa eu ver a moça
Que eu também vou atrás
E a banda diz: - assim é que se faz."

No fim da estrofe, Phillip piscou para Carolina, que deu um sorriso que iluminou todo o salão. Estava feliz por ter tido mais um dia inesquecível com ele.





* ator americano famoso por seus filmes de faroeste.

01 outubro 2012

11 - Domingo Especial



Carolina acordou com o sol penetrando em seu quarto, pulou da cama e ligou correndo para Luca, seu amigo, e o convidou para irem juntos à praia. Muito tempo que Carolina não sabia o que era pegar um bronze e ficou animada com isso. E também, queria contar as novidades para o seu melhor amigo.
Luca topou na hora e em meia hora bateria em sua casa para buscá-la. 
Carolina não tinha carro e nem sabia dirigir, nunca teve vontade, por isso na maioria das vezes seus amigos é quem davam carona.
Luca era um amigo divertido, tinha um estilo próprio muito bacana, por vezes melancólico, mas sempre muito objetivo e encorajador. Carolina o adorava!
Vestiu seu biquíni e na bolsa de praia, colocou alguns biscoitos, seu protetor solar e labial e uma toalha grande e, na mão carregou seu chapéu de palha que sempre levava e foi.
Luca foi pontual e já estava esperando Carolina no carro.
Foram para uma praia mais distante do que eles costumavam ir. 
Escolheram um lugar próximo da água, sentaram-se e começaram a conversa.
- Conheci um rapaz essa semana e estamos saindo, mas tudo muito amigável, sabe?
- Ele é casado? - falou Luca logo de cara.
- Não! Mas já foi, é separado.
- Ainda gosta da mulher?
- Acho que não, ele me explicou a situação. Inclusive a conheci.
- Conheceu a bruaca? Conte-me!!!
- Foi sem querer...
- É lógico que foi. - falou Luca num tom baixo de voz.
- Eu ouvi, hein? Foi o seguinte, fui até o trabalho dele e ela estava lá, discutindo com ele. Estão brigando pelo apartamento.
- Ihh, Carolzinha. Que furada você se meteu...
- Furada nada, para! Será??? - Carolina ficou confusa.
- Não sei, me diz você. - falou Luca em um ar blasé.
- Estou gostando dele e me parece que ele também, ora... Ontem mesmo, fomos a um karaokê.
- Hmmm, karaokê é legal. Já rolou beijo, pegação?
- Não, tudo muito respeitoso e sabe? Estou gostando assim, depois daquele idiota, você sabe bem, estou querendo curtir a pessoa antes de qualquer beijo, dos finalmentes e de qualquer tipo de laço carnal. 
- Mas você não transou logo de cara com o falecido, poupe-me! - falou Luca.
- Não, mas só fui conhecê-lo mesmo depois que transamos e ele achou que eu era propriedade dele, não quero mais isso.
- É, eu sei, você tem razão, mas acho que... Como é o nome dele?
- Phillip. 
- Nome de bofe rico, acertei?
- Se é rico não sei, mas é lindo, charmoso e tudo de bom! - gargalhou Carolina.
- Se ele tiver um amigo assim, você me apresenta, por favor! - riu junto Luca. - Bem, voltando ao assunto, acho que ele também está indo com calma, olha a bruaca da ex! Ele não quer passar pelo mesmo sufoco.
- É... – falou Carolina relembrando as coisas que aconteceram.
E voltaram para as suas posições, Luca com uma água de coco na mão, a outra segurando os óculos escuros, observando as pessoas, enquanto Carolina enfiava-se no chapéu de palha para proteger seu rosto, mas querendo seu bronzeado mais que fenomenal para mais tarde.
Carolina e Luca resolveram almoçar em um restaurante na praia. E enquanto estavam lá, o celular de Carolina tocou; era Phillip. Carolina abriu um sorriso e Luca se empolgou com a amiga.
- Alô. - falou Carolina num tom suave.
- Oi, Carol, tudo bem? É Phillip.
- Eu sei, meu bem, como você está?
- Tudo ótimo, onde você está, Carol?
- Estou na praia, aliás, saindo dela, estamos almoçando.
- Nós? - perguntou Phillip pausadamente.
- Ah... Eu e Luca, meu amigo.
- Amigo? Hmmm.
- Amigo sim, não precisa ficar com ciúmes...
Enquanto isso, Luca ria descontroladamente.
- Meu amigo de todas as horas, desde sempre, lembre-se que eu já o conhecia antes de você, seu bobo!
- Estou apenas brincando, Carol, liga para esse bobo não. - riu Phillip.
- Não ligo mesmo! - devolveu o riso Carolina.
- Quero te levar a um lugar hoje, pode ser?
- Claro que sim, onde? Ah... Já sei, surpresa!
- Exatamente! Às 16 horas te pego em casa.
- Tá bom, te espero. Beijo!
- Outro beijo, tchau!
Com Phillip era assim, praticidade acima de tudo, ele chegava logo ao ponto, sem meandros. E Carolina gostava disso.
Carolina olhou-se no espelho do quarto, de corpo inteiro e gostou do que viu. Estava com uma corzinha, não mais com aquela cara de escritório.
Como iriam sair daqui a pouco, iria colocar um vestido leve, acreditava que não seria nada formal.
Então, colocou a primeira roupa que viu no guarda-roupa,se isso fosse possível, mas estava feliz e a roupa não importava muito.
Era um vestidinho de alcinhas com estampa floral e a barra formada de tules rosa, que Carolina nunca usou. Optou por usar um sapato oxford dourado para quebrar o estilo muito menininha. Carolina gostou da combinação. Passou um batom clarinho e um gloss, ajeitou os cabelos castanhos deixando-os soltos e esperou por Phillip assistindo a TV.
Miguel e o pai, Júlio, tinham ido à casa da avó, mãe do pai de Carolina para uma visita. Miguel gostava de ir para lá, pois tinha muitos amigos, coisa que no prédio deles, isso não existia, pois era um prédio antigo, de três andares, com uma pequena varanda e sem área de lazer e os vizinhos em sua maioria eram idosos ou beirando a 3ª idade. Miguel era a única criança ali. Mas Carolina gostava do prédio, era sossegado e ventilado. Era aconchegante.
A gata já sabendo que Carolina iria sair, escondeu-se pela casa e só Deus saberia onde ela se enfiara.
Carolina deu um pulo com o toque do interfone. Levou um susto. Atendeu e pediu para Phillip esperar que já estava descendo. Correu para o banheiro, passou sua colônia, olhou-se mais uma vez no espelho, fez biquinho e saiu.
Chegando à calçada, viu Phillip segurando um cachorro pela coleira. Ele era lindo! Um labrador, marrom, com olhos cor de mel e assim que ele viu Carolina, pulou em cima, com as patas enormes e começou a lamber seu rosto.
Phillip levou um susto e deu um puxão na coleira e fez com que o cachorro sossegasse. Mas o rabo do animal não parava de se mexer.
- É seu, Phill? - perguntou Carolina animada.
- Sim! É o Bento, meu dog. Acho que não precisa de mais apresentações, ele fez questão de se precipitar, né garotão? - Phillip balançou a cabeça de Bento.
- Ele é lindo! Prazer Bento! - falou Carolina, fazendo carinho no pêlo do animal.
- Ele é muito bagunceiro, mas muito carinhoso, adora as pessoas. Principalmente crianças.
- Posso imaginar e aposto que elas o adoram também!
- Ô! E como, - falou Phillip orgulhoso.
- Vem, vamos! 
Phillip puxou Carolina pela mão, abriu a porta do carro para ela e colocou Bento no banco de trás.
Quando chegaram, Carolina avistou uma rua arborizada e tranquila. Mas, para chegar até o local era preciso deixar o carro na calçada e caminhar um longo caminho. A tal casa ficava num lugar escondido, mas o que se via era muito bonito. Muitas árvores, pássaros cantando, um jardim florido e outro sendo preparado para outros fins. Phillip acenou para o jardineiro que o saudou com um bom dia animado.
A casa já estava aos olhos de Carolina e Phillip. Era uma casa grande, com uma imensa varanda; algumas cadeiras penduradas pelo teto, como de balanço e outras espalhadas, todas de cortiça. Muitas flores e placas de "Seja Bem-vindo", "Sorria", "Aqui Moram Pessoas Queridas" enfeitavam o lugar.
Era um asilo, com uma enorme placa: "Asilo Canto dos Românticos".
Phillip soltou Bento da coleira e ele fez a festa indo direto aos idosos que estavam na varanda. Todos festejaram a presença de Bento, dando abraços, beijos e balançando sua cabecinha e orelhas.
Phillip olhou para Carolina sorrindo. Carolina estava impressionada.
- Trouxe você aqui hoje para conhecer meus amigos. - falou Phillip.
- Alguém da sua família está aqui? - perguntou Carolina surpresa.
- Não, não. Uma vez fizemos um trabalho de publicidade para o asilo e com isso resolvi conhecer o lugar para saber como faríamos. Achei o lugar tão gostoso, que resolvi vir sempre com o Bento para uma visita e também para fazermos pequenas doações. Alguns são muito solitários aqui, então juntei o povo do trabalho e doamos livros, revistas, filmes, músicas, roupas, alimentos, não tudo de uma vez, claro, mas listamos o que queremos dar e damos no dia estipulado. 
- Nossa, Phill, uma atitude muito bacana!
- Achei que você iria gostar!
Assim que Carolina entrou para conhecer os idosos, todos a olharam sorridentes, antes mesmo de Phillip falar, eles já a beijavam no rosto, pegavam sua mão e a abraçavam.
- Phill, sua namorada é tão linda, porque você nunca a trouxe aqui? - falou uma senhora simpática.
- Estou trazendo agora, Heidi!
- Ela é tão lindinha! - falou a senhora juntando suas mãos no rosto de Carolina.
- Obrigada. -falou Carolina.
- Quando é que vocês vão se casar? - falou outra parecendo a Dona Benta, com tricô nas mãos.
- Quando ela quiser, Joana! - respondeu Phillip rindo para Carolina, que ficou toda encabulada.
Um senhor saiu da casa, direto falar com Phillip e o levou para dar uma olhada no jardim. E com isso Carolina ficou sozinha com os idosos.
Um deles a levou para conhecer a casaeassim que entrou ouviu uma música embalando o ambiente, era José Augusto. Seu pai ouvia muito. 
A casa continha vários quartos, um colado ao outro, a sala ficava no meio com várias poltronas e sofás, com muitas almofadas que foram feitas pelas moradoras. O sol da manhã entrava pela porta principal da casa que era larga e estava sempre aberta. Se os moradores abrissem as portas dos seus quartos, ficaria ainda mais iluminada. Alguns quartos estavam fechados, mas os que Carolina conseguira ver, eram pequenos, contendo uma cama, um pequeno armário e uma mesinha com uma cadeira. Alguns colocavam fotos dos netos nas paredes, outros tinham santos postos em altares. Cada um com sua particularidade. Em um, vi um grande quadrocomfoto preta e branca de um casal sorrindo um para o outro.
- Esse casal vivia aqui. O Francisco faleceu há um mês. Giselda continua aqui, mas está muito triste ainda. - falou Castiel, o cicerone, para Carolina.
Em outro quarto uma coleção espetacular de corujas, todas em miniatura, ficavam em três prateleiras suspensas.
- Essa aqui, a Milena, adora colecionar! Têm mais coisas nos armários, depois ela mostra para você. - falou Castiel sem cerimônia.
Carolina olhava tudo minuciosamente e deu um aperto no peito. Pensou no quanto aquelas pessoas eram infelizes por terem sido deixadas de lado pelos familiares. Pensou na mãe. Que saudade tinha dela. Não faria isso com ela, se ainda estivesse viva e nem com o pai.
Castiel, o senhor franzino, mas muito agitado levou Carolina até a cozinha. A cozinha era clara pelo dia, arejada e espaçosa e tinha uma mesa central com bancos de madeira. Um jarro bonito com flores decorava o local. Não tinha ninguém ali, mas se sentia o cheirinho de comida sendo feita.
- A cozinheira deve ter ido até o pomar. - Castiel parecia ler os pensamentos de Carolina.
A porta da cozinha levava ao pomar e realmente, a cozinheira estava lá. Era uma mulher de meia idade, baixinha, de cabelos escuros e muito simpática.
- Oi! - falou ao ver Carolina.
- Oi, sou Carol, vim com Phillip!
- Phillip está aqui? Ai, que saudade estava daquele menino! Fale para ele que teve sorte, fiz o pudim de leite condensado que ele adora!
- Ahhh, vou dizer sim, aliás, nem precisa... - Carolina terminou a frase quando avistou Phillip na porta da cozinha.
Cléa foi em direção a Phillip e o abraçou, dando palmadinhas em suas costas. 
- Saudade de você, menino, andou sumido, hein? - falou Cléa.
- Muito trabalho, me desculpe! 
- Tanto está desculpado, que adivinhei que você viria e fiz aquele pudim. - falou Cléa rindo.
- Não acredito! Guarda um pedaço para mim e para Carolina, por favor!
- Lógico, filho!
- E então, gostou de Carolina? - perguntou Phillip piscando para Cléa.
- Ela é linda e combina com você! 
Carolina não tinha ouvido, pois estava conversando com Castiel.
Quando saíram da cozinha, Carolina e Phillip foram para a varanda bater papo com os idosos, enquanto Bento ia dar um alô para cada um deles. 
A casa tinha doze moradores, a cozinheira Cléa não morava ali, mastrabalhava todos os dias e saía às 18 horas. O responsável pelo localiaduas vezes na semana, mas ele colocou um casal como assistente e eles estavam todos os dias ali para algum problema ou outras questões, que ficava numa sala à parte.
Carolina ficou sentada num toco de madeira olhando para as senhoras. E elas admiravam seu vestido e perguntavam sobre sua vida.
Uma delas prometera que faria um xale para ela quando viesse da próxima vez.
Carolina sentia-setriste e feliz ao mesmo tempo por ver aqueles idosos enfrentarem a vida com a cabeça erguida, sem se abalarem com o passado, com as incertezas e com o abandono. Estavam juntos nessa jornada, faziam companhia um para o outro, se divertiam e era isso que eles queriam, uma vida tranquila, num lugar belo e acolhedor.
"Talvez eles não teriam essa vida se estivessem com seus familiares. Pode ser." pensou Carolina.
Na volta para casa, Phillip notara uma Carolina triste e pensativa.
- O que foi, Carol? Estou achando você triste.
- Nada não, Phill.
- Como nada? Você não estava assim, me conte o que houve!
- Sei lá. Senti uma tristeza com esses idosos e ao mesmo tempo feliz por eles terem esse lar.
- Eles são felizes lá, Carol, apesar de alguns terem sido abandonados por suas famílias, mas muitos vão lá para visitá-los. Muitos não têm paciência ou mesmo tempo para cuidar deles, mas acredito que alguns se preocupam e vão visitá-los.
- Eu vi tristeza em muitos ali, Phill e pensei nos meus pais, na saudade que sinto da minha mãe, de não ter a visto envelhecer. 
- Você nunca contou o que aconteceu a sua mãe.
- Não gosto de falar sobre isso, mas posso contar a você.
- Não se sinta pressionada.
- Não, tudo bem, é preciso falar sobre isso também. Minha mãe faleceu quando ela tinha 50 anos, infarto fulminante. Ela estava fazendo o almoço e de repente passou muito mal e morreu nos meus braços. Miguel não tinha chegado da escola e meu pai estava na rua. Estávamos sozinhas, isso foi há dois anos.
- Nossa, Carol. Sinto muito. - falou Phillip abalado.
- Eu não sabia o que fazer, entrei em desespero, liguei para a emergência, mas não tinha mais jeito. A pessoa que mais amava na vida tinha ido embora. Foi difícil contar para o Miguel o que tinha acontecido, muito difícil. - Carolina já estava aos prantos.
Phillip estava desconcertado, parou numa calçada, desligou o motor do carro e a abraçou. Ficaram calados por um momento, até Carolina se recompor e seguirem viagem.