10 agosto 2012

45 - Natal


Enfim, Natal.
Elena estava agitada com os preparativos. Queria tudo perfeito. Tinha um jeitinho delicado, mas era muito enérgica com as ordens que dava aos empregados. Apesar disso, nunca levantou a voz para nenhum deles e estava sempre os ajudando em algum problema fora dali. Elena tinha a candura de um anjo e a vigilância de um soldado em uma trincheira. Era atenta a tudo e apesar disso, todos nutriam uma simpatia por ela, principalmente Constantin que a admirava sem ela perceber. Enquanto ela ditava ordens, Constantin estava recostado no sofá, lendo seu jornal e observando os empregados para lá e para cá com Elena trabalhando com eles. Era um trabalho em conjunto e disciplinado. Neste dia, ela deu folga para Ivete e contratou outras duas senhoras para ajudarem na arrumação da casa e principalmente da ceia.
Às 17 horas tudo estava arrumado e organizado do jeito que Elena assim determinou. O pessoal chegaria em uma hora e Elena e Constantin resolveram que já era hora de se arrumarem para a festa.
A árvore de Natal que Elena montou junto com suas ajudantes era enorme e parecia as de shopping de tão decorada e luxuosa. Ao redor da árvore, inúmeros presentes, de vários tamanhos. Bento estava a postos próximo da árvore como um segurança, fazendo qualquer intruso pensar duas vezes em fuxicar algum presente.
Constantin foi o primeiro a descer, já com a indumentária apropriada para a ocasião, calças caqui com camisa de manga longa na cor verde bandeira, sapatos com fivelas e um chapéu panamá cor tabaco. Estava parecendo um Leprechaun* roliço. Foi até a saleta e no toca discos (Constantin conservava ainda seu aparelho antigo, pois achava que o som saía melhor que essas porcarias tecnológicas. Era o que ele sempre falava quando alguém se deparava com o aparelho do arco da velha e também porque não tinha coragem de jogar os vinis fora, era o seu legado) colocou um blues energético para animar o ambiente e encheu seu copo de uísque.
Elena apareceu logo em seguida vestindo uma blusa de mangas na cor roxa, saia de estampa de zebra com um cinto grosso preto e maxicolar preto e dourado. Estava bem maquiada e penteada e ficou encantada com o resultado final da decoração.
Aproximou-se de Constantin para aguardar a visita da família de Carolina.
A campainha tocou e toda a trupe estava aglomerada na porta esperando a permissão para entrarem.
Eles receberam os convidados sorridentes, cumprimentando com beijos e abraços.
- Olá, meus amores! - bradou Elena com sotaque carregado.
- Oi, Dona Elena, como vai a senhora? Esse é meu pai Júlio e meu irmão Miguel. - falou Carolina fazendo as devidas apresentações.
- Prazer. Júlio ao seu dispor. - cumprimentou o pai de Carolina de forma cortês. - Seu Constantin! - apertando a mão do mesmo, inclinando ligeiramente a cabeça.
- Oi, meu filho, veio combinando com Carol? - perguntou Elena reparando na mesma cor de roupa de Phillip e Carolina.
- Parece mesmo que combinamos, mas foi puro acaso. - falou Carolina, que vestia uma saia curta branca de laise e uma blusa verde clara.
- Um belo acaso! - afirmou Phillip que vestia uma camisa polo também verde clara. – Mãe, Pai, vocês já conhecem o Otto, mas essa é Sara, namorada dele e amiga de Carolina.
- Coincidência terrível! - riu Elena. Bela moça, como vai?
- Tudo bem e a senhora? Obrigada pelo convite. Feliz Natal! – cumprimentou Sara entrando na grande sala de mãos dadas com Otto.
- Ahh, Seu Constantin, tudo firmeza? - Otto abraçou com grande euforia Constantin. - Dona Elena! - e dando beijinhos delicados na anfitriã.
- Bem, entrem e fiquem à vontade! - falou Elena.
Sara e Otto estavam contentes pelo convite.
Todos se ajeitaram nos sofás e poltronas da grande sala principal. Miguel foi direto brincar com Bento, elegante com sua gravata borboleta vermelha e que até então estava de guarda ao lado da árvore, mas assim que viu Miguel, deixou a guarda de lado e começou a fazer festa para o seu visitante.
Carolina puxou Sara para mostrar-lhe a bela casa de Phillip e ficaram encantadas com a decoração de Natal. A mesa onde iriam se sentar para a ceia estava enfeitada com uma toalha branca com detalhes floridos em tom verde, os guardanapos eram vermelhos e os porta guardanapos tinham o mesmo tom e enfeitavam as louças branca com detalhes dourados. Os talheres estavam devidamente organizados como manda a etiqueta, junto com as taças clássicas para água e vinho.
Dispostos na mesa, vários porta-velas em forma de cuias vazadas nas cor verde e suas mini-velas acesas, que davam um charme extra a decoração.
Elena também espalhou pela sala alguns castiçais, velas, arranjos de flores em vasos rosa e verde e enfeites de passarinhos, papais noéis e guirlandas douradas.
Os quitutes, como a Torta de maçã, Tender com calda de caramelo e o Bolo de amêndoas com frutas secas ficavam em uma mesa sobressalente do lado direito da mesa principal juntamente com outras iguarias. Na mesa do lado esquerdo ficavam os panetones, as frutas e os minicupcakes para alegria de Miguel e feito especialmente para ele. O menu principal, o Peru, só seria servido quando todos estivessem a postos na mesa.
O grupo estava animado; conversavam, bebiam e petiscavam ao redor da grande árvore de Natal e do presépio que parecia uma casa de bonecas, de tão grande. E quando deu o horário da ceia, Elena bateu um sininho para dar início às comemorações.
Primeiro, ela pegou o menino Jesus e o colocou na manjedoura, em referência ao nascimento e chamou todos para uma pequena oração. Depois disso todos se abraçaram e desejaram um Feliz Natal e Miguel ansioso, perguntava quando iriam abrir os presentes. Carolina o acalmou dizendo que seria naquele mesmo minuto.
Depois que todos ficaram contentes com os presentes distribuídos, foi a vez de Constantin chamar o grupo para se juntarem à mesa. Constantin sentou-se na cabeceira da mesa como um rei, segurando seu copo de uísque, com voz potente e agradecendo pelo privilégio de receber os convidados ali, em sua humilde residência. Fez perguntas a todos, começando por Miguel.
- E aí, meu rapaz, estudando muito?
- Já estou de férias, tio Constantin. - falou Miguel sem rodeios.
- Ah, sim, é verdade, então, o que pretende ser quando crescer?
- Médico! - Miguel tinha a profissão na ponta da língua de tantas vezes que era sabatinado. Quando era menor, ele falava que queria ser pintor de paredes, ficava admirado toda vez que a casa era pintada e ficava sentadinho observando a ação do pintor, mas foi mudando com o tempo, querendo algo mais ambicioso, como ser um médico.
- Esse meu filho é muito estudioso. Espero mesmo que ele siga essa profissão. Acho formidável! - falou Júlio orgulhoso.
- E o senhor, o que faz? - perguntou Constantin virando-se para olhar diretamente para Júlio.
- Eu? Sou aposentado, mas trabalhei com comércio ao longo da minha vida, agora, nas horas vagas, eu pesco! - Júlio sorriu.
- Um pescador, ãh? - falou Constantin arrastando o 'r'.
- E dos bons! Ele me ensinou a colocar isca em um anzol e já sei o que é um tucunaré! Ótimo professor. - retorquiu Phillip.
- Já fiz muita pescaria quando era jovem, acho até que me esqueci como é pescar. - falou Constantin saudoso.
- Não seja por isso, o convido a vir pescar um dia, mas precisa ser bem cedo! Da outra vez que fomos, mal consegui um peixe. - Júlio olhou para Miguel que revidou a reprimenda revirando os olhos de tédio.
- E você, meu rapaz, como vai a família? - perguntou Constantin olhando para Otto.
- De qual família você está se referindo?
- Ora, você tem mais de uma? - perguntou confuso Constantin.
- Sim, agora tenho. - Otto olhou para Sara que estava sentada ao seu lado e comunicou: - Eu e Sara formaremos uma família, pedi em casamento há poucos dias. - sorriu Otto orgulhoso.
- Meu Deus, que boa notícia, Otto! Parabéns, Sara! E quando será isso? - perguntou Elena levantando as mãos em um gesto de oração.
- Felicitações ao casal! Vamos brindar! - falou Constantin, já nitidamente entorpecido pela bebida.
- Ainda não marcamos, Dona Elena. Vamos planejar com mais calma. - falou Sara colocando os pés no chão.
- Nós ficamos muito felizes com a notícia, pois foi por causa de um plano nosso que juntamos o casal. - falou Phillip.
- Sim e para ser sincera, não achei que fosse dar certo. - riu Carolina.
- Não precisa dizer que vocês serão nossos padrinhos. - falou Otto para Phillip e Carolina.
- Estamos juntos, irmão! - falou Phillip, levantando a taça de vinho.
- E eu? Faço o quê? - perguntou Miguel.
- Você deve servir para ser pajem, você é baixinho. - brincou Otto.
- Isso é coisa para criança, eu já sou quase um adulto! E ainda vou crescer!
Todos caíram na risada.
Elena ouviu um apito vindo da cozinha e foi correndo buscar o Peru de Natal. Constantin ensaiou bater palmas, assim que sua esposa adentrou na sala com o esperado prato, mas foi repreendido pela mesma. 
E esse foi o Natal dos Spencer, que há muitos anos não tinham uma grande reunião com pessoas queridas e animadas, pois eram sempre os três ali, sossegados, comemorando o Natal, mas agora a espaçosa casa parecia realmente abrigar os convidados com sua alegria.
- Rabanada quentinha, para quem gosta, para quem gosta, rabanada quentinha! - repetia Constantin levantando a travessa cheia de rabanadas como se fosse um troféu.



*Figura mitológica do folclore da Irlanda, caracterizado como um duende.

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